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A fé em suas diferentes formas

São Paulo possui uma grande diversidade religiosa que contrasta com a crescente intolerância
Fotos: Amanda M. Faria

A cidade de São Paulo tem cerca de 12,4 milhões de habitantes, com contribuições culturais e religiosas por toda parte. Pessoas com diferentes crenças, muitas vezes, são alvos de piadas e preconceitos vindos de indivíduos que não compactuam com suas convicções. A intolerância está presente e se manifesta mais do que imaginamos pelas ruas paulistanas.

De acordo com Marcelo Gaspar, professor do Estado e candomblecista, é importante que haja uma discussão sobre religiões nas escolas, apenas com o intuito de prevenir a incomplacência, sem direcionamentos, tratando-se de um estado laico. Essa separação entre Estado e Igreja, teoricamente, assegura uma governabilidade imune à influência de dogmas religiosos. Ou, pelo menos, é o que deveria ocorrer. “O Candomblé é onde fico bem em todos os sentidos, onde encontro respostas para questionamentos e a paz interior. Essa religião sofre muita intolerância vinda de pessoas que não a conhecem, pois creem em uma única verdade.”, finaliza Marcelo.

Foto: Amanda M. Faria

As religiões de matrizes africanas estão no Brasil desde o período colonial, quando os escravos eram impedidos de seguir sua cultura, sendo obrigados a utilizar nomes de santidades católicas para se referir aos seus deuses e orixás sem que fossem repreendidos. Daí surge o sincretismo cultural. A Umbanda, principalmente, possui uma grande ligação com a religião Católica. Os orixás são sincretizados com nomes de santos conhecidos no catolicismo. “É uma religião que simboliza a caridade. Temos muitos orixás sincretizados na Igreja Católica. Mas, fazemos o bem sem olhar a quem.”, afirma Keli Freitas, que comanda o Centro de Umbanda Recanto de Fé, Amor e Caridade com seu marido Orides Pereira, que completa: “Diferente do que muitas pessoas pensam, a Umbanda é regida pela bondade ao próximo e, principalmente, pela caridade.”.

Foto: Amanda M. Faria

Assim como as religiões afro-brasileiras, evangélicos, católicos, testemunhas de Jeová e outros também sofrem com discriminação. O pastor da Igreja Evangélica Missão Mundial Graça e Paz, Paulo Moura, afirma que um dos argumentos utilizados é de que sua religião não presta. Já Eliane Silva, Testemunha de Jeová, afirma: “Nunca presenciei algum caso de intolerância religiosa. Porém, já sofri discriminação, sendo convidada a deixar o curso do magistério e terminar em outra escola por ser uma Testemunha de Jeová. Não aprendi a desrespeitar a qualquer pessoa por suas crenças, nacionalidade, preferências, pois aprendi que Deus é amor e que em toda a nação o homem que o serve é aceitável a ele.”. O blog 360° também conversou com a funcionária pública Angela Tieko Tanaka, católica apostólica romana, que expressou sua opinião sobre os conhecidos casos de preconceito religioso em São Paulo: "Sempre segui a religião católica, mas conheci outras. Acredito que não devemos fazer com o próximo aquilo que não gostaríamos que fizessem conosco, é muito simples.".

Infelizmente, é uma realidade baseada em fatos. Procurando sobre Testemunhas de Jeová em sites de busca na internet, os links mais acessados falam como se essa religião fosse perigosa, mentirosa. Quando, na realidade, eles são conhecidos como "Estudantes da Bíblia". Trata-se de uma religião cristã não trinitária, eles creem em um Deus único, Jeová, e são seguidores de Jesus, crendo completamente no que está escrito na bíblia. A intolerância está em nossa frente, todos os momentos, só não enxerga quem não quer.

Em janeiro deste ano, ocorreu o ato de combate ao preconceito religioso, no MASP – promovido pelo Governo do Estado de São Paulo –, e manifestantes pediram mais empatia entre as pessoas, respeito às crenças e também aos ateus, pois a falta de crença não deve ser motivo para discriminação ou ódio. Além de atos públicos, a prefeitura promove excursões para turistas e moradores da cidade conhecer um pouco mais sobre as diversas religiões existentes.

“O islamismo é uma das religiões mais pacíficas que existem. Condena todo tipo de violência, seja com si mesmo ou com os outros. Preza a família e o amor.”, conta a estudante muçulmana Zahra Kaebi. 
O preconceito é resultado da falta de conhecimento, o Brasil é um país grande culturalmente falando, e seria impossível possuir apenas uma crença. 
É importante que a população seja conscientizada através de ações positivas, sem demagogias, para que entendam que o caráter de um cidadão não é definido por sua fé ou pela falta dela.
De acordo com o estudo feito pela Secretaria Municipal de Promoção da Igualdade Racial (SMPIR), chamado “Diversidade Étnico-Racial e Pluralismo Religioso no Município de São Paulo”:


Também foi constatado que o número de ateus cresceu em 10%.
“Não só eu presenciei, como o Brasil todo já presenciou... É desumano o preconceito que os povos que professam crenças de matrizes africanas sofrem. O que mais me orgulha no judaísmo é o direito de questionar, somos desde pequenos ensinados a questionar tudo, mas sempre a respeitar as diferenças.”, disse Yuri Zaitune Y. Halevi, judeu e acadêmico de Direito. A dona de casa e espírita kardecista, Vera Lúcia, completa o pensamento de Yuri sobre o respeito às diferenças: “Se desejamos o bem, ele vem. Se espalhamos amor, ele fica. Se sorrimos, sorrisos recebemos. Pode demorar, pode não ser sempre. Mas, se tem uma coisa que o espiritismo ensina é a ser grato com a vida.”.

Existe, também na capital paulista, o Fórum Permanente de Liberdade de Crença Cultura de Paz, que se trata de um grupo de trabalho que fomenta a criação de políticas públicas que combatem à intolerância religiosa, compostos por membros do Poder Público e da sociedade civil - não remunerados. O Fórum conta com a representação de ateus, budistas, católicos, evangélicos, hare krishnas, judaicos, matrizes africanas, islâmicos, entre outros.

O cidadão que for vítima de qualquer tipo de preconceito, agressão ou humilhação deve registrar o caso à Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos, pelo telefone: 155. Segundo dados do Comitê Nacional da Diversidade Religiosa, a cada três dias uma denúncia é feita pelo site. O Comitê foi instituído em 2014, pelo Governo Federal e tem como objetivo diminuir os casos de indivíduos intolerantes motivados pelo ódio contra crenças religiosas diferentes.



Reportagem Amanda M. Faria

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